
Glaydson José da Silva é historiador e professor da Universidade Federal de São Paulo; seu livro História Antiga e usos do Passado. Um estudo de apropriações da Antiguidade sob o regime de Vichy (1940-1944) é uma versão revisada de sua tese de doutorado na qual analisa como a modernidade pode usar o passado.
O assunto geral é o regime de Vichy e o objeto de análise o passado gaulês, romano e galo-romano usado para justificar a dominação alemã e o colaboracionismo francês com a Alemanha na Segunda Guerra Mundial. As fontes são materiais da época, como livros acadêmicos, livros de vulgarização científica, manuais de História e de Arqueologia, jornais, revistas, discursos, textos oficiais, correspondências, cartazes, moedas e outros.
Resumindo, o texto discute as noções de herança e de legado a fim de explicar como se constituem os mitos fundadores, os quais perpetuam valores e imagens da vida nacional, com o objetivo de criar identidades pelo uso da ideia de permanência. Além disso, aborda como a História e a Arqueologia assumem um papel importante nesse contexto, pois estão a serviço do Estado e permitem qual tipo de memória se pode (re)construir – uma tradição de apropriação do passado em prol do governo com dimensões gigantescas nos séculos XIX e XX, principalmente durante as duas grandes guerras.
A obra trata, em especial, do caso francês a partir do nascimento do herói Vercingetórix na escrita da História francesa, desde o fim da Revolução de 1789 até a Segunda Guerra Mundial. Em síntese, reflete sobre como na França a disciplina histórica está atrelada à memórias construídas durante a elaboração da identidade nacional e, também, constitui-se em uma História mitológica – afinal, cria mitos de origem – encontrada principalmente na escola, espaço ideal de divulgação e popularização, e tendo na política sua primeira finalidade já que são controladas por discursos desse gênero.
Já atualmente, como se pode ler no livro, esse mito gaulês continua sendo veementemente defendido pelo partido de extrema direita F.N. A sua juventude nacionalista e racista, um exemplo, orgulha-se em exaltar suas origens gaulesas na internet, em camisetas, prospectos, letras de músicas e outros. Sendo que esse uso feito pelo partido do passado ainda é pouco estudado.
Com isso, a pergunta de conclusão do texto é: qual lugar a antiguidade ocupa em nossas sociedades? Questão que permite pensar sobre o ofício do historiador, principalmente o do mundo antigo, e se encaixa nas recentes discussões sobre o presentismo da História. Enfim, a importância de indagar acerca desse lugar permite notar a utilização da História a serviço de certa lógica justificadora e legitimadora de questões identitárias, nacionais, raciais e políticas.
Referências
História Antiga e usos do Passado. Um estudo de apropriações da Antiguidade sob o regime de Vichy (1940-1944). São Paulo: Annablume; FAPESP, 2007.
- Camilla Miranda Martins