A entrevistada de hoje é Semíramis Corsi Silva, graduada, mestre e doutora em História pela Universidade Estadual Paulista (UNESP/Franca). Atualmente é professora de História Antiga da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

Quando você decidiu que queria estudar o mundo antigo? Como foi esse processo?
Decidi que pesquisaria sobre o mundo antigo já no primeiro ano da graduação de História. Eu estava na busca por um objeto para pesquisar, minha vontade era estudar sobre magia e feitiçaria, o que sempre despertou minha curiosidade. Em 2000, durante um minicurso, estudei sobre a magia praticada pelos antigos romanos e romanas e fiquei encantada com a temática.
Quais são os seus livros favoritos? (Antigos ou contemporâneos sobre os antigos).
São muitos. Mas para resumir, gosto bastante dos Epigramas de Marcial, das Sátiras de Horácio, do Satyricon de Petrônio, etc. É incrível como mesmo tendo sido escritos há quase dois mil anos atrás eles ainda nos fazem rir. É preciso, porém, perceber o tom moralista destas obras, ver como o humor pode ser uma poderosa arma política à favor das elites, no caso deles, mas podendo também se reverter à favor dos oprimidos. Das obras contemporâneas gosto muito dos livros de Paul Veyne, meu historiador preferido. Trata-se de um historiador polêmico, mas citaria, entre várias obras dele, o livro Como nosso mundo se tornou cristão. Gosto de seus argumentos.
Quais são os seus temas atuais de pesquisa?
Atualmente pesquiso sobre um imperador romano conhecido como Heliogábalo, que governou Roma entre 218 e 222. Por ter origens siríacas e ser sacerdote de Elagabal, um deus solar sírio cujos sacerdotes realizavam intervenções no corpo, segundo minhas pesquisas têm apontado, este imperador foi considerado “transgênero” na documentação antiga, ou seja, considerado feminino e desejando, inclusive, cortar suas genitálias masculinas e ter uma vagina (conforme conta Dião Cássio, seu detrator). Por conta disso, atualmente tenho me debruçado sobre estudos de gênero e corpo na Antiguidade.
O que você deseja pesquisar no futuro? Algum tema em especial?
Por conta da proximidade da cultura siríaca de Heliogábalo com as culturas apresentadas no Antigo Testamento, tenho desejado me aventurar a estudar o variado universo cultural do Crescente Fértil, mais especificamente em torno das culturas do eixo sírio-palestino antigo. Mas também desejo muito trabalhar com algumas recepções contemporâneas de Heliogábalo, o que tenho já começado a fazer com o Teatro, em especial com a obra de Antonin Artaud (1896-1948), um escritor e ator francês. Como fiz teatro e sou apaixonada por essa arte, tem sido uma experiência muito legal, em especial por estudar um revolucionário como Artaud e seu Teatro da Crueldade. Acredito que temos que estudar coisas que nos emocionem e aliar Heliogábalo a Artaud tem sido muito especial para mim.
Existe algum lugar que marcou a sua relação com o mundo greco-romano/antigo? Qual?
Roma. Conheci a cidade eterna em 2012, por ocasião do meu doutorado sanduíche na Europa e, ao ir embora, tive vontade de me ajoelhar e agradecer pela existência de cada ruína, de cada pedrinha.
Qual é o seu personagem (ficcional ou não) favorito do mundo clássico/antigo? Por que?
Certamente Heliogábalo, acho sua rebeldia, fé fervorosa e capacidade de levar a cabo o que acreditava (seu culto ao deus Elagabal) fascinantes. As fontes apontam tentativas de Heliogábalo em se adaptar a alguns elementos da governabilidade romana, mas sua cultura siríaca falou mais alto em suas práticas político-administrativas, o que o levou a ser bastante rejeitado. Gosto dos antagonistas.
E, para finalizar, qual grego ou romano você chamaria pra um café? Sobre o que conversariam?
Pode ser um judeu do contexto romano? Se sim, chamaria Jesus Cristo para um café. Tenho muita curiosidade pela história de Jesus, no que ela foi transformada pelos evangelistas, pelos pais da Igreja e pela Igreja que surgiu a partir daí. Assim, cinco minutos com o mais famoso personagem da História seria de grande riqueza para desvelar um pouco sobre o homem que há por trás do mito. Conversaríamos sobre suas ideias, seria fascinante ouvir suas próprias palavras.