O ensino online do mundo antigo – Parte 2

Imagem: © Nick Lowndes 2020
Fonte: The Economist

A convite da equipe do blog, trago hoje algumas sugestões de materiais que podem auxiliar no ensino e na aprendizagem da história e da cultura da Antiguidade, principalmente gregos e romanos. Acumulei esses recursos porque, além de ser graduado em Letras Português/Latim e doutorando em Letras na UFPR, também sou professor de língua latina. Para dar aulas desse idioma, é sempre importante trabalhar em sala de aula com questões que englobam outras áreas do conhecimento dedicadas ao mundo antigo.

Acredito que, antes de tudo, é importante entender que há pouca coisa em português disponível na internet. Devido a isso, decidi me concentrar em recursos visuais. Uma primeira sugestão, mais ampla, é o curso de história da arte do Mediterrâneo Antigo da plataforma Khan Academy, que é de livre acesso e contém imagens, texto (em inglês), mapas, plantas de edifícios e projeções 3D. Há ainda outros endereços na internet que, em geral, dedicam-se a um ou outro tipo de material, como veremos.

Projeções 3D
Em português, há a opção da área de interatividade 3D do site do Laboratório de Arqueologia Romana Provincial (LARP), da Universidade de São Paulo (USP). Lá você pode acessar dez aplicativos feitos por arqueólogos que representam diferentes facetas da realidade romana antiga, além de um jogo, O último banquete em Herculano, que pode ser interessante a depender do perfil do estudante.

Ainda em relação à interatividade, é possível acessar outras opções, desta vez em inglês, como: o site Ancient Athens 3D; os modelos de reconstrução de Pompeia e do restante da Roma antiga da Altair4 Multimedia; e os vídeos do canal Archeology3D do YouTube. Para dar uma noção de como se dá uma parte do trabalho do arqueólogo hoje em dia, talvez seja uma boa ideia assistir um vídeo sobre as recentes escavações de estudantes brasileiros na ilha de Despotiko, no mar Egeu, disponível no canal de YouTube da TV UFMG, da Universidade Federal de Minas Gerais:

Imagens
Para imagens em geral, sejam fotografias dos sítios arqueológicos hoje em dia, sejam representações gráficas de paisagens da Antiguidade, um meio por vezes subestimado é a Wikimedia Commons. Basta digitar o que você quiser no campo de pesquisa e investigar todas as possibilidades. Por exemplo, recentemente, procurei plantas de casas romanas e encontrei algumas de Pompeia (link 1 e link 2). Caso queira demonstrar em aula como era a escrita na Roma antiga, uma dica mais específica é esta seção de fotografias de inscrições latinas do site Lacus Curtius. Além de serem fontes históricas, esses registros podem ser usados para estimular o interesse do aluno pelas línguas clássicas.

Mapas
Para mapas, uma fonte variada e gratuita é o site do Ancient World Mapping Center, um centro de pesquisa da University of North Carolina, dos Estados Unidos. Na aba “Free Maps”, há mapas de diversas regiões geográficas do mundo antigo. Eles estão parcialmente em inglês, porém podem ser utilizados, apesar disso, em sala de aula com alunos que não dominem esse idioma.

Outra fonte para situar a Antiguidade geograficamente é o site Livius, de história antiga, em que cada artigo contém um texto em inglês, imagens e o local de um acontecimento histórico, de um edifício ou de uma cidade, apontado num mapa gerado pelo Open Street Map. Por meio da mesma plataforma, o site Vici também apresenta uma espécie de atlas que indica onde estão os sítios arqueológicos antigos no mundo, com imagens e dados específicos, sendo mais um meio de relacionar o passado ao presente.

Blogs em português
A depender da faixa etária, pode ser interessante mostrar os relatos de apresentações de peças teatrais baseadas em textos antigos presentes no blog Palco Clássico, da professora Renata Cazarini, da Universidade Federal Fluminense (UFF). Outro site pertinente para a sala de aula é o Grécia Antiga, com recursos diversos feitos por classicistas brasileiros. Esse portal oferece textos introdutórios sobre diversos elementos da cultura grega, imagens diversas e uma coletânea de textos traduzidos para o português, com notas e comentários.

Existem muitas outras fontes de materiais pela internet, porém preferi me restringir a essas que apresentei para dar um panorama das opções. Espero que essas recomendações sirvam para as suas necessidades de ensino e aprendizagem de história e cultura antigas, tanto nesses difíceis tempos de pandemia quanto no futuro.

  • Daniel Falkemback Ribeiro

Nós precisamos falar sobre o sexto ano

Eu não sei quando foi a última vez que você esteve em uma turma de sexto ano, ou quantos anos você tinha quando isso ocorreu. Mas eu devo admitir que eles podem ser particularmente intimidadores: não se engane pelas carinhas fofas, os sextos anos são da pesada. Em geral, a relação entre os professores recém-formados e essas criaturinhas é marcada pelos extremos: ame ou odeie (odeie é uma palavra forte. Ame ou corra para as colinas talvez fosse mais adequado). O sexto ano não é blasé: eles não são adolescentes, e farão as perguntas mais inusitadas: “qual a cor do esmalte da Cleópatra?”; “mas e se um gladiador combinasse de não brigar com o outro?”; “os deuses gregos ainda existem?”; ao mesmo tempo em que se interessam pelo que você diz eles não terão receios em apontar incoerências na sua fala.

Mas estamos em um blog sobre a Antiguidade Clássica, por que falar sobre os alunos do ensino fundamental? Bem, se você tem algum interesse em divulgar o mundo antigo ou gosta da sua pesquisa eu acho que está na hora de você se preocupar com o público pré-adolescente. Em breve esse será o único momento em que boa parte da população terá um contato institucional / escolar com o mundo clássico. Com a aprovação das reformas do BNCC (Base Nacional Curricular Comum) e do Ensino Médio, o ensino de história deixou de ser obrigatório no Ensino Médio e passará a ser uma disciplina facultativa, exclusiva aos que se interessarem em cumprir créditos relativos ao tema. Ou seja, boa parte do aprendizado sobre Grécia e Roma deixará de ocorrer da forma como compreendemos, e estará, cada vez mais, delegada aos meios de comunicação e entretenimento: vídeo games, filmes, séries e canais do youtube, por exemplo.

Excluindo a discussão sobre a necessidade de divulgação de pesquisa nos meios digitais (tema para outro texto), eu me pergunto como iremos nos adaptar a esta nova conjuntura. Alunos no sexto ano têm, em média, onze anos, e portanto ainda não desenvolveram completamente o pensamento abstrato, motivo pelo qual as aulas tendem a ser voltadas muito mais para questões práticas do mundo antigo: o que os romanos comiam, como eles se vestiam, como era o teatro grego ou a divisão de uma domus romana. Ainda que estes temas sejam relevantes e adequados para a idade, não são suficientes para que eles tenham algum domínio sobre o passado clássico. E aqui nós temos um problema: como podemos, enquanto classicistas, professores e entusiastas do mundo antigo, atuar para que esta breve passagem no ensino fundamental não seja a única aproximação com a antiguidade? Infelizmente a realidade sobre o tema não é encorajadora, e termina com uma série de questões:  como podemos, conjuntamente, construir respostas para os problemas que se colocam? Como desenvolver ferramentas de ensino que favoreçam o engajamento de longo prazo sobre o mundo antigo? Como produzir materiais didáticos que destaquem a antiguidade como um tema relevante e que despertem o interesse destes alunos? Estes são alguns dos desafios que surgem em nosso horizonte. Por vezes tão acostumados ao silêncio das bibliotecas e espaços de pesquisa talvez tenhamos que nos atentar para os ruídos provenientes do sexto ano.

  • Lorena Pantaleão