Fábio Duarte Joly

O entrevistado dessa semana é Fábio Duarte Joly, professor de História Antiga na Universidade Federal de Ouro Preto.

Fábio Duarte Joly. Foto Acervo pessoal.

Quando você decidiu que queria estudar o mundo antigo? Como foi esse processo?

Lembro que meu interesse pelo mundo antigo surgiu durante o ensino médio, com as aulas de História, e também pelo fato de meu pai, como professor de Filosofia, ter em casa livros de Platão e Aristóteles, que comecei a ler então. Depois, aos poucos fui adquirindo livros de História Antiga e de autores gregos e romanos, aprofundando assim meu interesse. Quando entrei na Universidade de São Paulo em 1994, para cursar História, já estava decidido a trilhar o estudo da História Antiga. A Iniciação Científica, sob orientação do professor Norberto Guarinello, foi uma etapa fundamental para o início da construção de um trajeto de pesquisa.

Quais são os seus livros favoritos? (antigos ou contemporâneos sobre os antigos)

São muitos, mas, dos antigos, Platão, Aristóteles, Tácito, Sêneca, Petrônio e Suetônio (esses quatro últimos com os quais trabalhei mais diretamente no mestrado e doutorado). Dos modernos, gosto das obras de M. Rostovtzeff, M. Finley, N. Guarinello e R. Syme, relevantes não só pela visão abrangente que têm da Antiguidade, mas ainda pelas relações que fazem com questões do mundo contemporâneo.

Quais são os seus temas atuais de pesquisa?

Estudo atualmente as relações entre liberdade, escravidão e cidadania de Augusto a Nero, uma pesquisa que é uma ampliação de meus estudos de doutorado.

O que você deseja pesquisar no futuro? Algum tema em especial?

Gostaria de estudar os diversos processos de escravização e escravidão no Mediterrâneo antigo de uma forma mais ampliada e comparada.

Existe algum lugar que marcou a sua relação com o mundo greco-romano/antigo? Qual?

Uma viagem à Inglaterra em 2003, para a pesquisa de doutorado, foi muito importante para essa relação, com a visita a museus e sítios arqueológicos. Uma visita a Roma em 2004, com idas a Pompeia e Óstia, também foi marcante.

Qual é o seu personagem (ficcional ou não) favorito do mundo clássico/antigo? Por quê?

Trimalcião, o rico liberto descrito no Satyricon, de Petrônio, por justamente embaralhar as fronteiras que estabelecemos entre ficção e realidade.

E, para finalizar, qual grego ou romano você chamaria pra um café? Sobre o que conversariam?

Talvez Tácito, para saber o que escrevera nas partes de suas obras históricas que não chegaram até nós.

Guerra e Escravidão no Mundo Romano

O texto “Guerra e Escravidão no Mundo Romano”, escrito por Fábio Duarte Joly, constitui o sétimo capítulo do livro “História Militar do Mundo Antigo”, organizado por Pedro Paulo A. Funari, Margarida de Carvalho, Claudio Umpierre Carllan e Érica Cristyane Morais da Silva. Nesse texto, Joly realiza uma discussão acerca das revoltas de escravos na Roma antiga – especificamente as que ocorreram na Sicília e na Península Itálica, nos séculos II e I a. C –, apontando diversas questões oferecidas pelas fontes que merecem maiores estudos. A primeira discussão que levanta é sobre como a leitura de que, na sociedade romana, o exército era composto somente por cidadãos é uma tentativa de homogeneização – já que fontes como cartas de Plínio a Trajano atestam a presença de escravos nas tropas, seja como auxiliares de seus senhores ou recrutas ilegais. A partir dessa discussão, Joly apresenta alguns questionamentos sobre a permeabilidade da fronteira entre cidadão e escravo – destacando essa área como uma que necessita de maiores estudos.

Sobre as revoltas de escravos, o autor chama atenção para as diversas leituras realizadas sobre as fontes: Espártaco, por exemplo, foi lido no século XVIII como um ícone de inspiração na luta por liberdade política na Europa; posteriormente, foi transformado pela leitura marxista em um símbolo de revolução proletária. Além disso, também é apresentado como autores de língua latina (como Floro e César) se referem a Espártaco como um tumulto marcado por pouca organização e ausência de comando – não utilizando, portanto, a denominação de “guerra”, que seria reservada à atuação de homens livres e bem organizados. Já autores de língua latina (como Diodoro da Sicília e Plutarco) atribuem aos líderes das revoltas de escravos um olhar mais positivo. Dessa forma, Joly conclui que o discurso sobre as guerras servis tem relação com a construção da identidade grega ou romana.

O autor conclui seu texto com uma reflexão a respeito do que define o sucesso de uma revolta servil, defendendo que a visão de que as revoltas escravas são fadadas ao fracasso devido a uma incapacidade inata de organização dos escravos deve ser contestada. Isso deve ser feito implementando novos olhares às fontes – que, por apresentarem a visão da classe senhorial, são utilizadas para salientar uma ausência de grandes objetivos por parte dos escravos.

Referência:
JOLY, Fábio Duarte. “Guerra e Escravidão no Mundo Romano”. In: CARLAN, C. U.; CARVALHO, M. M.; FUNARI, P. P.; SILVA, E. C. M. (org.). História Militar do Mundo Antigo. São Paulo: Annablume, 2012, pp. 139-149.

  • Letícia Schevisbisky de Souza